Cultura

Democracia efetiva: entre preços e valores

Democracia efetiva: entre preços e valores

Democracia efetiva: entre preços e valores

Em viagem à China no primeiro semestre deste ano, conhecida figura política brasileira teceu elogios à chamada “democracia efetiva” do país asiático, comparando-a à visão vigente no Ocidente acerca do regime democrático. Será cabível a relativização do conceito de democracia, como defendido por tal pessoa pública, ou a noção democrática não aceita o referido grau de flexibilização? Conquistas econômicas e a melhora nas condições materiais de vida da população em um território com restrições em termos de liberdade de expressão são elementos aptos a caracterizar um país como uma democracia? São tópicos que merecem análise. 

É fundamental compreender, primeiramente, que a noção de democracia implica dupla dimensão: um aspecto formal ou instrumental, que consiste na aferição da vontade da maioria de modo honesto, sem qualquer tipo de manobra fraudulenta; e um elemento material ou substancial, que compreende a concretização dos direitos fundamentais dos cidadãos, em respeito à dignidade dos indivíduos que integram determinada comunidade. Há relação de mútua implicação entre tais dimensões, uma vez que o aspecto instrumental permite o incremento dos direitos e o exercício destes implica a liberdade de tomar decisões e participar das deliberações da coletividade, de modo direto ou indireto. Em caso de ausência de um dos dois elementos, não há que se falar em democracia (ao menos, segundo a visão consagrada historicamente no campo ocidental do planeta).

Assim sendo, importante salientar que a tentativa de adjetivar a realidade democrática (como ocorreu pela figura política brasileira, atribuindo à experiência chinesa a qualificação de “efetiva”) parece não corresponder à melhor doutrina sobre o assunto. Cientificamente, aliás, a correção terminológica não se presta à flexibilidade que debates políticos, em geral, acabam por conferir a certos termos. A realidade presente na China, com todos os seus pontos positivos e negativos (em termos políticos, econômicos e sociais) é outra coisa, mas não propriamente democrática. A população pode ou não estar satisfeita com a forma como a vida cotidiana é conduzida pelo governo no país asiático, mas isso não autoriza o desvirtuamento do conceito de democracia. 

A existência de crescimento invejável da economia chinesa nas últimas décadas não torna o país asiático uma “democracia efetiva” pois, como visto, tal sistema de exercício de poder demanda uma estrutura de direitos mais ampla do que aqueles que tangenciam apenas as condições materiais de vida. Portanto, o desenvolvimento econômico é necessário, mas não suficiente, para a manutenção de um ambiente democrático saudável. Isso é sobejamente demonstrado atualmente por países cuja democracia tem sido abalada, entre outros motivos (como questões de identidade), pela falta de crescimento da economia ou, ao menos, ampliação da desigualdade econômica na sociedade.

Como visto, portanto, não é possível aceitar a degeneração do conceito democrático com a finalidade de exaltar o crescimento econômico de determinado país. A noção de democracia envolve alguma complexidade e é muito cara à população para que seja manipulada sem que haja qualquer reflexão a respeito. Democracia envolve valores indispensáveis à dignidade humana. Ainda que o crescimento econômico seja de fundamental importância para a melhora nas condições de vida da comunidade (e, assim, facilite a implementação de alguns direitos fundamentais), é sempre relevante salientar que nem tudo pode ser comprado. Em um mundo onde há tentativa de precificar quase tudo, cabe lembrar que valor e preço são coisas diferentes. A democracia, cuja dimensão principal é plasmada por valores, não pode ser comprada por preço algum.

*O conteúdo dos artigos assinados não representa necessariamente a opinião do Mackenzie. 
 

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